Primeiras impressões: “Ray Donovan”, ou “os-podres-de-Hollywood-que-você-precisa-saber-e-ver”


É dito-e-certo e nenhuma novidade que, para causar boa impressão ao telespectador, uma série precisa apresentar os mínimos erros possíveis, ou nenhum. Ray Donovan, até aqui, não é nenhuma surpresa de tirar o fôlego, mas triunfou, diga-se de passagem, no quesito inovação. A nova série da Showtime – que há muito não brilhava na TV fechada com suas séries –, que estreou ontem (30) nos Estados Unidos (mas vazou na web uma semana antes), apresenta uma proposta bem peculiar: decide escancarar os podres das estrelas hollywoodianas e as maneiras como são contornadas essas situações tanto quanto desagradáveis. Até aqui, tudo parece muito tranquilo. Mas a série de Ann Biderman (Southland) não se contenta só com isso. Ray Donovan, personagem que dá nome à série, é o centro da história e aquele que resolve todos os problemas que envolvem as estrelas de Hollywood, menos os que o rodeiam diretamente.

Uma série que aposta num personagem centro de tudo está passível de incalculáveis erros que vão desde perfil e nuances oferecidas até o relacionamento desse centro com os demais núcleos. A história, aqui, segue o personagem-título que, até este episódio-piloto, se mostrou livre de qualquer desses problemas circundantes. Ray possui todas as nuances possíveis para ser exploradas. Ele é o tipo de personagem que necessita ser meticulosamente apresentado por ter sido minuciosamente trabalhado. O “especialista-em-resolver-os-problemas-dos-famosos-californianos" teria todos os motivos para causar má impressão num primeiro olhar, não fosse pelo ator que até parece que carrega a essência de Donovan até na última gota de sangue das veias. Liev Schreiber compõe um Ray misterioso, prático e inteligente que não poupa esforços para cumprir com maestria as tarefas que lhe são dadas. Por exemplo, no primeiro episódio, o personagem livrou um atleta que se envolveu com a morte por overdose de uma desconhecida, tira um ator do alvo das câmeras da TMZ por envolvimento com travestis e ainda ajuda um antigo caso da mira de um stalker pervertido. Não dá pra levar muito a sério alguns detalhes dessa trama, daí a oscilação entre o drama e a dramédia que você poderá encontrará (ou não) nos próximos episódios.


Além de tudo isso, Ray ainda precisa ser um solucionador de problemas familiares próprios, mas nisso ele não tem especialização. O jogo com as personalidades distintas empregadas no personagem não é o único ponto positivo deste piloto. Grande parte dos créditos devem-se a Jon Voight (e todos os olhares devem se voltar a ele no decorrer da trama), que sempre se mostrou eficiente para interpretar grandiosíssimos personagens – desculpem-me o termo, meus caros – filhos-da-mãe e canalhas. É Voight que vai estabelecer um dos lados da história e, como o sinistro da trama, tentará acabar com a vida do próprio filho, Ray Donovan, sempre dando, em doses homeopáticas, o tom canalha e cínico ao personagem. Até atribuiríamos algum destaque aos demais personagens, se eles tivessem um mínimo de destaque na série, com exceção dos irmãos Donovan que tentaram mostrar que há muito por traz dos problemas quase insignificantes com os quais foram apresentados.

O piloto de Ray Donovan foi respeitável e, sim, houve pontos negativos, mas talvez seja muito cedo para apontá-los como possíveis problemas futuros da série (como os subplots que envolvem as estrelas californianas e as figuras que aparentemente são descartáveis). Apesar de vertentes como sexo, palavrões e drogas estarem presentes em parte considerável da trama, não são os pontos principais e a série não é só sobre isso, estes são apenas complementos que ajudam a desenhar o psicológico dos personagens. A série de Biderman conseguiu deixar perguntas no ar (e muitas, deve-se dizer) e, por seu caráter inovador e peculiar quase, pode ter provocado no telespectador uma ânsia que pouco temos visto (será que  tinta verde e taco de beisebol serão uma saída para Ray impedir a canalhice do vovô sinistrão?). 


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