Review: "Amor Pleno", não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar

Quando comecei a assistir Amor Pleno, logo o associei ao filme Árvore da Vida, ambos dirigidos por Terrence Malick e sua marca espiritual, introspectiva e busca sobre o entendimento do ser.

O filme nos conta a história de Neil (Ben Affleck), um jovem que vai a Paris e conhece Marina (Olga Kurylenko), depois de algum tempo os dois resolvem voltar aos Estados Unidos e viver numa cidadezinha no interior de Oklahoma, onde Neil mora e trabalha. Os dois passam a viver juntos, entretanto a vida não os ajuda muito em meio a tantas reflexões e desentendimentos, Marina volta a Europa e Neil reencontra uma antiga paixão, mas descobre que Marina de fato era o amor de sua vida, então ela retorna, contudo as consternações voltam a ocorrer em sua vida conjugal.

Amor Pleno é um misto de sentimentos a flor da pele, os pensamentos são expressos por sussurros, o filme é genuinamente visual, cenas e diálogos quebrados nos levam a uma série de reflexões. Não há porquês, apenas ações concebidas por meio de pensamentos. As cenas de amor são expressas em campos, campos vazios, jardins ou cômodos vazios, com os amantes correndo de um lado para o outro num vai e vêm inesperado, as casas são vazias, há poucos móveis e isso, expressa toda a tristeza daquele casal que não sabe muito bem que caminho trilhar, que estrada seguir.

O filme contém uma belíssima fotografia que por si só já é uma obra de arte, belos cenários e vestimentas sugestivas, com cenas curtas, além de cortes abruptos, inesperados e secos, através do filme, observamos a fragmentação da vida aos olhos de Malick, as imagens parecem mais uma dança bem estruturada contrastando os belos cenários cinzentos e vazios com a profundidade encontrada na atuação de cada personagem que não são compostos por dramáticos exagerados. A clareza nos pensamentos e as expressões conseguem dar vida ao invólucro emocional que cada um esconde dentro de si, como se estivessem em meio às tribulações de uma vida real onde o eu esta em conflito consigo mesmo. Além disso, o filme ainda ganha pontos com sua trilha sonora de Hanan Townshend que consegue dar sentido e completar as cenas de forma que elas não se tornem melodramáticas, clichês e convencionais.

Talvez o filme não atraia de fato os olhares de todas as pessoas e com certeza nunca se tornará um blockbuster, sua natureza não é e nunca será se tornar um deles, o filme parece mais um fruto de todas as dúvidas, inquietações que Malick possui a cerca do amor e também do relacionamento do homem com Deus. É praticamente impossível diante de tantas imagens utilizadas como meio de linguagem não se envolver com filme de forma que o telespectador quer saber o que se passará a seguir.

O filme trata do Amor de forma incondicional, o amor que Marina esperava encontrar em Neil, um amor que não se mede, feito o amor que alguns têm por Deus, o diretor e roteirista trabalha o amor em sua forma mais sublime e pura. Neil, no entanto permanece quieto e introspectivo e parece ter medo de criar com Marina qualquer vínculo afetivo profundo e duradouro.


Em meio há tanto sofrimento ainda acompanhamos a vida de Padre Quintana que esta passando por uma crise de fé e não consegue enxergar o menor sentido em tudo aquilo que faz e que prega, tenta recorrer a Deus, mas tudo que consegue é apenas o silêncio esmagador e angustiante. A sua busca incessante por um contato com o divino, acaba o colocando num vazio existencial gigante, ele tenta de todas as formas suprir ou preencher este vazio, mas não consegue de forma alguma. Isso o leva a uma serie de questionamentos a respeito do amor divino. Se deus é amor porque ele se esconde? E porque deus não se compadece de todo sofrimento que há no mundo? E de certa forma, qual a razão de experimentarmos um vazio tão grande que habita nossa alma e toma conta de nosso ser de forma a perambular os piores pensamentos que possa existir em nossas mentes?

Os diálogos do filme se entrelaçam à medida que as ideias expostas através de pensamentos vão ficando cada vez mais claras, enquanto Marina e Neil não conseguem o tão sonhado amor que se espera Padre Quintana não encontra (por mais que procure) o amor de um Deus que talvez nem exista (ou exista estamos falando em possibilidades), a questão é que ambos esperam um amor recíproco, porém este não é correspondido com tal intensidade ardente. Talvez o diretor queira mostrar que quando amamos alguém nos tornamos tão fracos de tal forma que passamos a ver naquela pessoa uma espécie de divindade e esperamos que esta nos veja da mesma forma, mas nem todos são capazes de sentir o amor tão profundamente, e isso é projetado dentro de nós mesmos, ou na natureza e pessoas que nos cercam.

Amor Pleno não trás as respostas que buscamos, mas incita novos questionamentos a respeito do amor, um amor que não existe mais que procuramos, procuramos, mas  não encontramos, as pessoas não se amam mais, abandonaram seus princípios suas vontades, em função de algo que nem mesmo elas sabem o que é. Aqueles que buscam ao longo de sua vida experimentar o amor pleno não devem esperar recebê-lo de ninguém, antes deve ofertá-lo a aquele que não pode dar-lhes nada em troca.  O filme vem tocar no íntimo espiritual de cada ser humano, afinal quem nunca amou? Como diria Schopenhauer, o amor é o objetivo último de quase toda preocupação humana; é por isso que ele influencia nos assuntos mais relevantes, interrompe as tarefas mais sérias e por vezes desorienta as cabeças mais geniais.

O filme é pura arte filosofia. Um filme para ser refletido, discutido e apreciado, e seu valor artístico deveria ser reconhecido por todos, porém este não é um filme para todos os tipos de telespectadores, portanto não vá assisti-lo esperando encontrar algo comum. Terrence Malick constrói uma narrativa semiótica que capta o indizível e é dotado de um detalhismo que quase chega a perfeição, cada parte que compõe todo o filme é cheia de significação e sentido, constituídas por simbolismos, metáforas e rimas visuais. Em suma Amor Pleno é indicado para que aqueles que possuem tamanha sensibilidade, e não vá assisti-lo esperando encontrar uma narrativa linear ou um romance convencional, eu não ousarei aqui a dizer quais de vocês possuem tal prestígio apenas deixo minhas opiniões e espero que assistam e tirem suas próprias conclusões.









To The Wonder
Diretor: Terrence Malick
País de origem: EUA
Elenco: Ben Affleck, Olga Kurylenko, Rachel McAdams
Ano de lançamento: 2012


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